quinta-feira, 5 de março de 2009

Em tempos dramáticos, a validade do apelo melodramático

Por Max Gimenes

Baseado no livro homônimo de Bernhard Schlink, o filme O leitor tem em seu elenco a ganhadora do Oscar de melhor atriz de 2009, Kate Winslet, que interpreta uma humilde cobradora de bonde que acaba por envolver-se sexualmente com um jovem (Michael, interpretado por David Kross) cerca de 20 anos mais novo. A mistura de literatura e sexo torna o caso dos dois curioso, mais próximo da inocência que do vulgar. Até que Hanna, a cobradora, some de maneira enigmática.

O longa se passa na Alemanha dos anos 1950, após a derrocada nazista. E o nazismo não passa incólume. Após o sumiço de Hanna e o longo tempo que ela e Michael passam longe um do outro, os dois se encontram em um julgamento de crimes cometidos por nazistas. Ele como estudante de direito, ela como ré. A temática do nazismo parece esgotada, mas com O leitor percebemos que sempre há espaço para uma abordagem nova, diferente.

O inusitado é a superação da forma geralmente maniqueísta ou simplista por meio da qual o tema é tratado. Aqueles que julgam ser conhecedores da verdade absoluta e inquestionável terão motivos para entrar em crise com suas certezas. Um colega de curso de Michael considera criminosos todos que deixaram de se levantar de alguma forma contra as barbaridades empreendidas pelos nazistas. A tese parece válida... mas será mesmo?

O filme levanta uma série de questões interessantes para reflexão e uma delas é justamente deixar de lado preconceitos e buscar entender as motivações que levaram uma parcela da sociedade dos países dominados pelo nazi-fascismo a apoiá-lo, ainda que tacitamente. A sugestão de que o mundo, no período da Segunda Guerra, não se dividia entre pessoas boas, de um lado, e nazistas, de outro, soa algo óbvia.

Hanna é levada a julgamento e abdica de se defender, curiosamente, o que constitui o mistério a ser revelado pelo espectador. Suspense este intimamente ligado ao porquê de ela ter de certo modo participado do regime do Füher. Já repararam como a ignorância ajuda e eleger e a manter regimes e políticos da pior espécie no poder? Às vezes parece acaso; às vezes, não. E não se trata de absolver os crimes cometidos, mas de buscar compreendê-los.

A leitura, como mostra o filme, tem poder: liberta mentes, derruba barreiras, amplia horizontes e, assim, possibilita a construção do novo – como uma sociedade de homens e mulheres livres, por exemplo. Livres não por serem definidos assim no papel, numa lei ou algo do gênero. Livres por terem sido emancipados, por poderem pensar com suas próprias cabeças. Livres da manipulação do poder, seja ele político ou econômico. O acesso ao saber, nota-se, é o melhor que se pode fazer contra as tiranias e todo o mal que delas advém.

Alguns podem classificar O leitor como melodramático, e talvez o seja mesmo, mas esse ainda parece ser um valioso instrumento para abrir olhos, tocar corações e inquietar mentes em tempos de crise econômica e descrença política. Indicado para quem busca mais que entretenimento, para quem busca uma boa reflexão – e, sobretudo, forças para lutar por dias melhores.

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